UM CONVITE...

Quando uma sociedade é incapaz de criar as justificativas da sua existência, modifica imediatamente os mecanismos de produção das ideologias. A universidade sempre foi um desses mecanismos. Mas se a universidade já não pode mais dar resposta ao atual estágio de dominação, é porque de alguma forma as pessoas começaram a despertar. Deixaremos mais uma vez os soníferos discursos das modernizações conservadoras nos colocarem na cama ou nos levantaremos definitivamente? Fazemos, então, um convite à rebeldia e à criatividade. Não podemos aceitar a velha universidade burocratizada, nem a UNIVERSIDADE NOVA colonizada. Construamos nós, junto aos trabalhadores, a Universidade Popular!

COMUNA


quinta-feira, 17 de maio de 2007

ADM: Vanguarda da Privatização

[Por Fabrício Moreira – Militante do DAADM e d@ COMUNA]

A Escola de Administração da UFBA é um dos locais onde os processos de privatização, desresponsabilização e uso do espaço acadêmico como legitimação das atuais relações de poder é um dos mais avançados no Brasil. O discurso da legitimação das atuais relações sociais é tão forte, que a ênfase da faculdade é na gestão social, no desenvolvimento local e em áreas afins, afinal, eles querem nos ensinar a conviver harmoniosamente com o capitalismo. Até os estudantes que querem uma formação mais mercadológica são prejudicados, e os estudantes que querem uma formação crítica são atropelados com o ensino voltado para aprendermos a conviver com o capital e convencer os outros disso. Eles nos ensinam a ser gestores de relações sociais conflituosas para manutenção do status quo.

Só que as questões concretas da mercantilização estão ultrapassando todos os níveis cabíveis, vejamos alguns exemplos:

- Estão tirando as turmas de graduação do prédio e jogando para outras unidades, porque no lugar estão entrando cursos pagos;

- Muitos dos professores doutores SE RECUSAM a dar aula na graduação, e muitos do que o fazem é com absoluto descompromisso, com uma qualidade de ensino péssima;

- Estamos fisicamente perdendo espaço para uma grande variedade de projetos na área de consultoria, com financiamento público ou privado. Estes projetos tomam as salas, equipamentos, o tempo dos professores, etc.;

- Existem inúmeras consultorias sendo realizadas para empresas privadas e para o próprio estado;

- Querem fortalecer o Ensino à Distância e as novas tecnologias educacionais. Estão em todos os projetos nessa área: universidade corporativa, especialização à distância, mestrado à distância e agora querem começar também a graduação à distância. A fala de uma das professoras na reunião: "Daqui há cinco anos aula presencial será coisa do passado, não vai existir mais, será relíquia. Vocês vão poder contar aos seus filhos que eram do tempo em que viam o professor na sala. Se acostumem";

- A Escola faz várias pesquisas, mas os estudantes da graduação praticamente não participam delas, e os projetos de extensão da Escola são TODOS cursos pagos ou consultorias, apenas há 1 mês atrás que começou um projeto de extensão em comunidade que é gratuito, não sabemos se vai sobreviver nos próximos semestres;

- Hoje existem mais alunos de cursos pagos (especialização, mestrado e extensão), do que alunos de graduação, mestrado acadêmico e doutorado. Hoje existem mais professores atuando na Escola nestes cursos e projetos do que professores concursados;

- A qualidade de ensino é terrível: professores faltam muitas aulas, excesso de professores substitutos, provas ridículas. A monografia é uma grande farsa. Aliás, não existe defesa de monografia e muitas delas nem são lidas e avaliadas por pelo menos três professores;

- Não existe política de estágio, nem para complementar a formação com campos de prática nem para quem precisa trabalhar para se manter na faculdade. Estamos trabalhando em call-centers ou como vendedores em loja. Apenas os estudantes mais ricos, que podem estudar inglês, espanhol, fazer intercâmbio, trabalhar voluntariamente em outras consultorias pra ganhar currículo, etc., conseguem nos últimos semestres do curso virar estagiário ou trainee de grandes empresas. Ainda assim trabalham de segunda a sábado e no mínimo 8h por dia.

Enfim, são muitos problemas. Mas percebemos que toda a agenda do capital para a universidade pública está em andamento aqui: fundações de direito privado (são duas na Escola de Administração!), ensino à distância, cursos pagos, consultorias e projetos para captação de recursos no mercado, precarização do ensino, e PRINCIPALMENTE: resgatar e reforçar o papel da Universidade enquanto reprodutora das atuais relações de poder, pois ainda que forme mão-de-obra semi-qualificada seu papel central é produzir conhecimento para as classes dominantes, reproduzindo a ideologia do status quo.


O Projeto Administração Experimental e a Universidade Nova

Como uma escola que segue todos os ditames da "modernidade", é claro que a EAUFBA não ia ficar "por fora" dessa. Aliás, temos enfrentado este modelo de bacharelados interdisciplinares e inserção na agenda internacional do mercado de ensino superior há mais de 3 anos. Quando da retomada das discussões internas sobre o currículo, já havia um grupo forte de professores defendendo que nos adaptemos plenamente no modelo do Protocolo de Bolonha (base real que a Universidade Nova descaradamente copia). Já defendiam também ensino à distância, turmas de 300 alunos, etc. Os estudantes de Administração conseguiram barrar aquilo naquela época, mas os professores aprovaram o infame projeto "ADMINISTRAÇÃO EXPERIMENTAL".

Este projeto, fundamentalmente, significa testar a metodologia do bacharelado interdisciplinar nos moldes do Protocolo de Bolonha, usando toda a "moderna tecnologia educacional" já nos estudantes de graduação. Pegaram as turmas dos outros cursos que tem em seus currículos a disciplina Introdução à Administração, e juntaram em turmas de até 150 alunos (isso mesmo, 150 alunos!), dizendo que isso era "interdisciplinariedade". Detalhe: os professores disseram que a turma só não seria maior porque essa é a capacidade máxima do auditório. A primeira aula-show da semana é ministrada por um professor, e a segunda aula da semana é dividida em duas turmas de 70 a 80 alunos. Quem dá aula nessa segunda turma? Os estudantes do mestrado que acabaram de sair da graduação e ingressaram na pós!

É essa a grande "democratização do acesso" que a Universidade Nova nos apresenta: turmas com centenas de estudantes, qualidade do ensino extremamente precária, sem aumento de recursos para universidade pública, sem contratação de professores e liberando os professores que mais fazem projetos público-privados para pesquisarem temas interessantes aos grupos hegemônicos (pois conseguem financiamento farto). Afinal, você acha que estes professores dão aula? Que nada. Além de massificar a quantidade de alunos, colocam professores substitutos e monitores mestrandos (que não ganham por isso) para ministrar as aula. Precarizando ainda mais a figura do professor substituto (que deveria ser excepcional, mas já virou recorrente).

E a qualidade de ensino fica aonde mesmo? Ah, mas o projeto diz que somos interdisciplinares (150 estudantes de vários cursos assistindo uma aula-show, estilo cursinho pré-vestibular), que temos qualidade (professores substitutos e alunos de primeiro semestre do mestrado) e que há democratização do acesso (aumenta o número de vagas por as turmas terão centenas de estudantes).

Mas quando começamos a questionar os professores eles nos disseram que isso não tem nada haver com a Universidade Nova, que é tudo coisa inventada pela cabeça de aluno. Eles esqueceram que os Estudantes de Administração têm consciência de sua história de lutas. Quando os professores (não todos, mas a maioria) propuseram este projeto, os estudantes estavam presentes na reunião. Todos ouviram os professores declararem com orgulho que aquele modelo era o teste para a futura aplicação em larga escola (nacionalmente) do modelo de Bacharelado Interdisciplinar europeu, que agora é retomada na Universidade Nova. Eles, ao se auto-declararem vanguarda da privatização, esqueceram que os estudantes de ADM souberamaçdade privatizada,..

s uma vez! da reunião que aconteceu no inicio do mês de Maio às escondidas com o ministro da educação, que esteve na Escola de Administração da UFBA para conhecer o “caso de sucesso”, e que seria replicada já no próximo semestre em toda a UFBA, quiçá no Brasil.

Eles privatizam, nós nos organizamos!

Mas nós estudantes não somos apenas um elemento passivo, “produto” das aulas e do currículo. Somos seres pensantes, ativos, inseridos no mundo. Muitos lutaram e inclusive morreram na época da ditadura para que hoje tenhamos o direito de contestar o que a Universidade nos oferece. Se a intensidade da privatização daqui é forte, nós estudantes temos que ser ainda mais fortes e unidos para barrar esse processo, e no próprio processo de luta construir uma outra universidade, que atenda não apenas as nossas necessidades, mas da sociedade em que está inserida. E não é sociedade em abstrato, porque assim ela não existe, mas os grupos historicamente excluídos.

Hoje a universidade caminha para atender mais plenamente a necessidade dos grupos dominantes (os empresários de diferentes ramos). É vista inclusive por muitos estudantes como espaço necessário para se qualificar para o mercado de trabalho. Essa outra Universidade que propomos deve ser bem mais do que reproduzir os interesses dos grupos de poder. Estamos vendo historicamente os resultados da Universidade brasileira que sempre repetiu receitas “colonizadas” e elitizada, que simplesmente visavam a modernidade de forma conservadora, dizendo que deste modo seria mais benéfico para toda a população. Já se passaram 500 anos nesta lógica.

Dizemos “não”. Agora é a hora de rediscutir a Universidade a partir dos interesses e necessidades concretos da população. E não das classes dominantes mais uma vez, mas da imensa maioria da população que trabalha e com este trabalho mantêm a própria universidade, dos que sofrem com as desigualdades, da falida classe média hoje em processo de favelização. A partir de problemas concretos: desigualdade, fome, violência, falta de trabalho, emprego precarizado e sub-qualifcado, etc. Uma Universidade que se construa a partir disto, da nossa realidade concreta, daí o lema, por uma Universidade Popular.

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