UM CONVITE...

Quando uma sociedade é incapaz de criar as justificativas da sua existência, modifica imediatamente os mecanismos de produção das ideologias. A universidade sempre foi um desses mecanismos. Mas se a universidade já não pode mais dar resposta ao atual estágio de dominação, é porque de alguma forma as pessoas começaram a despertar. Deixaremos mais uma vez os soníferos discursos das modernizações conservadoras nos colocarem na cama ou nos levantaremos definitivamente? Fazemos, então, um convite à rebeldia e à criatividade. Não podemos aceitar a velha universidade burocratizada, nem a UNIVERSIDADE NOVA colonizada. Construamos nós, junto aos trabalhadores, a Universidade Popular!

COMUNA


terça-feira, 24 de junho de 2008

68 em 2008: Celebrar é Viver?

Ou Essas pessoas na sala de jantar...

[Por Vavá Oliveira - militante da COMUNA]

Por conta da efeméride (68-2008), um novo espectro ronda o mundo – o espectro da nostalgia. É preciso frisar, contudo, que essa "onda nostálgica" em relação ao ano de 1968 traz consigo uma contradição escamoteada: os eventos daquele ano não têm sido celebrados pela atualidade de seus princípios, mas pela superestimação de seus feitos. O que tenho notado, em todos os eventos comemorativos que participei este ano, é que a geração de 68 manifesta a melancolia daqueles que tentaram, mas não conseguiram fazer a revolução. E o pior, nesse mesmo cenário, duas gerações com mais de 30 anos de diferença entre si, encontram-se e partilham do mesmo ostracismo político.

Sigamos, então, para além da superfície inebriada das celebrações, em busca do pitoresco que esse "encontro" representa. Uma dessas gerações, a midiática geração 68, tem inúmeros motivos para lembrar com melancolia o "ano que não terminou" (Zuenir Ventura). Afinal, foi ela quem vivenciou, nas ruas das metrópoles ocidentais, a tentativa de concretização da revolução mais poética entre todas, mas que ao alcançar o poder político, nas décadas seguintes, abandonou a imaginação e, capitulada pela burocracia estatal, rendeu-se à monotonia do permitido. A outra geração, pode-se dizer, é a minha. Desiludida com a "política" que lhe é apresentada e sem ter experimentado a catarse dos momentos revolucionários, essa geração (ou a sua maior parte) expõe frustração e passividade ao "celebrar" o maio de 68 tal qual a geração 68 - como um "movimento do passado, já derrotado em seus princípios". Belo e importante, porém morto e empalhado na parede da sala de jantar – aquela mesma sala onde as pessoas "são ocupadas em nascer e morrer".

Nesse sentido, se torna evidente outra constatação: a "nostalgia" que nos atinge não estimula a ruptura de padrões comportamentais e políticos como em 68, mas somente uma postura que alterna entre a contemplação orgulhosa e o "choro pelo leite derramado". "É proibido proibir" e "Sejamos realistas, exijamos o impossível" deixaram de ser motes simbólicos das condutas, tornaram-se slogans em estratégias comerciais através das quais oferta-se uma juventude mitificada do passado em troca da adoração embasbacada e a resignação profunda no presente.

Essa nostalgia ainda é, em certa medida, manipuladora, pois isola no tempo e no espaço (Paris, SP, RJ, New York, Califórnia), um movimento que trazia consigo os princípios adotados pela parcela da juventude que resolveu contrariar o desígnio da passividade e construir um outro mundo hoje e agora. Quem acompanhar a atuação dos jovens militantes dos movimentos sociais mais combativos de nossa época, seja em Salvador, Palestina, Chiapas, ou Oaxaca, perceberá como também suas práticas os identificam com o simbólico ano de 1968. As ocupações das reitorias no Brasil bem como dos terrenos abandonados ou improdutivos estão aí para exemplificar o que digo.

É preciso, portanto, rejeitar a superestimação romântica do Maio de 68, estimulada pela geração que o viveu, mas, infelizmente, se tornou tão saudosista quanto melancólica. São esses "antigos jovens" que optam pela comemoração do início e do fim de 1968, omitindo a sua atualidade flagrante. Infelizmente, Caetano estava certo e aquela juventude de 68 que queria tomar o poder, e conseguiu, continua, ainda hoje, "não entendendo absolutamente nada!".

Certamente, são muitos os receosos das gerações que, em seu tempo, exercem a transgressão política e cultural. Eles vão lhe dizer que a idéia de revolução está morta e que a própria História - enquanto transformação do modo de organização da vida social - está fadada a acabar. Não importa, a rebeldia subversiva é o antídoto milenar contra o determinismo da opressão e da miséria. Façamos, agora, da herança 68 um referencial ativo para juventude que busca o exercício de uma prática militante não-burocrática e autoritária, mas criativa, horizontal e, sobretudo, revolucionária!

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Acampamento Maria Júlia Braga

(Universidade Federal Fluminense/Niterói/Rio de Janeiro)

http://www.xanta.milharal.org/amjb/index-old.htm
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=12363290

Segundo levantamentos estatísticos e conforme consta em diversos panfletos políticos no Movimento Estudantil, na Universidade Federal Fluminense, 70% do total dos estudantes ingressados na universidade não são de Niterói, e destes, um número significativo apresenta sérias dificuldades econômicas para dar prosseguimento aos seus estudos, o que se torna evidente no fato de a UFF ser uma das Universidades com maior índice de evasão em todo o país, por volta de 40% dos ingressados não conseguem dar prosseguimento aos estudos. (http://www.uff.br/uffon/noticias/2007/10/reuni-proposta-gt-uff-at.pdf, Segundo dados da própria reitoria em seu projeto de extensão: “Este esforço, com certeza, diminuirá nossa elevada evasão (45%)).

Constatando isso, a fim de solucionar esse problema já antigo, surgiu em outubro de 2002 o Fórum de Luta pela Moradia na UFF. Formou-se como movimento independente por entender que as forças políticas que hegemonizavam o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da universidade, não se propunham a travar uma luta real para atender aos interesses estudantis, em especial dos estudantes proletarizados, os quais são os principais demandatários de políticas de assistência, imprescindíveis para sua manutenção na universidade. No entendimento do Acampamento, as forças políticas tradicionais inseridas no Movimento Estudantil se mobilizam unicamente visando a manutenção de sua hegemonia em tal movimento. Mas o Fórum de Luta pela Moradia se constituiu de forma a se contrapor a essa tendência.

Uma das principais realizações desse movimento foi a elaboração de um dossiê sobre a questão da moradia. Tratava-se de um amplo estudo sobre as possibilidades de construção da moradia baseado na experiência de outras universidades as quais tiveram essa demanda atendida. Após a formulação de tal documento, uma passeata que contou com a presença de mais de 200 estudantes foi organizada para, no Conselho Universitário, órgão máximo de deliberação da universidade, exigir o comprometimento da reitoria para com a execução de um projeto de moradia.

Tal compromisso foi assumido através da composição de um Grupo de trabalho (GT) para elaborar o projeto, tendo o dossiê como referência. Este grupo de trabalho finalizou suas atividades, no entanto, a reitoria de Cícero Fialho, na época em sua segunda gestão, não implementou o projeto de moradia.

Como a Universidade Federal Fluminense não dispõe de uma moradia própria, cabia aos estudantes mais proletarizados apostar na Casa do Estudante Fluminense como único espaço que poderia os abrigar, sendo esta casa do Governo do estado e não federal, e podendo abrigar no máximo sessenta e quatro pessoas.

A antiga dona do prédio hoje ocupado pela Casa do Estudante Fluminense, Maria Júlia Braga, tinha por costume abrigar estudantes proletários que, muitas vezes, vindos do interior do estado não tinham como se manter na cidade de Niterói sem esta ajuda. Em seu testamento, tal senhora entregou a propriedade ao governo do Estado do Rio de Janeiro, de forma a servir de abrigo aos estudantes que assim necessitassem: surgiu então, em 1949, a Casa do Estudante Fluminense (CEF).

Diversos foram os ataques sofridos pelos moradores daquele espaço durante o período do regime militar, visto que muitos estudantes se opunham ao mesmo. Muitas foram as tentativas de fechar a Casa do Estudante Fluminense, a qual era atacada e estigmatizada para assim justificarem seu fechamento.

No entanto, foi apenas no ano de 2006, que o governo de Rosinha Garotinho expulsou a ala de estudantes combativos residentes na Casa do Estudante Fluminense. Tal expulsão se deu, pois os estudantes se negaram a aceitar exigências absurdas do Estado manifestadas num estatuto que, por exemplo, proibia reuniões religiosas ou políticas dentro do prédio, proibia quaisquer visitas aos residentes, expulsão de qualquer morador que adquirisse qualquer doença infecto-contagiosa, dentre outras arbitrariedades. Por isso, uma parcela dos estudantes se negou a aceitar a imposição de tal estatuto.

21 moradores foram expulsos no dia 4 de abril de 2006, e, desalojados, acamparam na calçada em frente a CEF, depois no gramado do jardim da reitoria da Universidade Federal Fluminense e após uma tempestade que destruiu seus barracões, passaram a ocupar o saguão da reitoria da Universidade Federal Fluminense. Lá ficaram quase um mês, partindo em seguida para o Campus do Gragoatá, visando assim, uma aproximação com os demais estudantes. Com a expulsão, surgiu o Acampamento Maria Júlia Braga – O Quilombo do século XXI – o qual, passou a incorporar novos adeptos os quais se integraram e apóiam atualmente esta luta política.

Vale lembrar que a expulsão promovida pelo governo do estado demonstrou o real interesse deste que é o de esvaziar a Casa do Estudante Fluminense, e possivelmente empregá-la para outros fins, evidenciado no fato de hoje tal casa abrigar apenas 24 estudantes, apesar de sua capacidade superar 60. E, mesmo dentre os estudantes que na época preferiram se submeter às exigências do estado, aliando-se a este e abrindo mão de seus direitos de residentes, hoje muitos estão também sendo expulsos através de um suspeito processo de seleção, que de seis em seis meses é realizado, sendo que um estudante aprovado hoje, seis meses depois é reprovado, pois alteraram-se os critérios.

Após a ida para o Gragoatá, o Acampamento conseguiu alguns adeptos e simpatizantes, mas houve também o afastamento das entidades de classe, ADUFF (Associação dos Docentes da Universidade Federal Fluminense) e do SINTUFF (Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal Fluminense). Este afastamento pode ser interpretado devido à falta de interesse político das suas direções em apoiar uma ocupação que não tinha nem data nem hora para acabar visto que o retorno para a Casa dos Estudantes já não era mais possível. Também ao término do pleito para reitor, não faria mais sentido apoiar a ocupação para dar visibilidade política para seu candidato.

Sabemos que quando ocorre algum fato político, no caso a expulsão, muita cobertura jornalística é dada, o que faz com que diversos grupos políticos se aproximem. Podemos observar nas reportagens e nas fotos da época da expulsão e do período logo após este acontecimento, muitos são os militantes de diversas correntes da esquerda como o P-SOL e PSTU que aparecem nas fotos ou entrevistados, inclusive o vereador Renatinho, eleito pelo P-SOL também é uma figura recorrente. No entanto, se a vitória não é imediata e a luta continua, o afastamento daqueles que atuam mais na política institucional burocrática do que no Movimento Social concreto, tende sempre a ocorrer.

Quando, em 4 de abril de 2007, o Acampamento Maria Júlia Braga – o Quilombo do Século XXI - completa um ano de existência, decide-se por realizar uma nova ocupação, agora no saguão da reitoria da Universidade. Esta ocupação ocorre em 23 de abril.

No dia 25 de abril, estando a reitoria ocupada, ocorre uma passeata organizada pelo Acampamento Maria Júlia Braga e o Grupo de Trabalho do Centro Acadêmico de História da UFF. Tal passeata mobilizou mais de 150 estudantes que partiram para a reunião do Conselho Universitário (órgão máximo de deliberação da universidade) exigindo assistência estudantil. Dentre as demandas apresentadas por esses estudantes estava a construção da moradia universitária, o conserto do ar condicionado da Biblioteca Central, contratação de professores, melhoria do bandejão, dentre outras. O destaque era para a questão da moradia: exigíamos a utilização de um prédio da UFF que estivesse sendo subutilizado como moradia temporária, até que a definitiva fosse finalizada.

Devido à pressão estudantil o reitor assinou uma carta em que se comprometia a encaminhar a Assistência Estudantil como pauta no próximo Conselho Universitário (para os militantes do PSTU e P-SOL, esta carta foi suficiente para que eles evadissem a ocupação do sétimo andar promovida após o término do CUV), e constituiu uma comissão destinada a discutir e apresentar soluções para a questão da moradia universitária na UFF. Esta comissão, composta por estudantes e professores, após suas reuniões concluiu que não seria interessante utilizar um prédio como moradia provisória dado o alto custo de adaptação deste. Decidiu-se que o melhor seria partir para a construção da moradia definitiva. Esta decisão foi apresentada e aprovada no Conselho Universitário seguinte. Portanto, a Moradia foi formalmente aprovada, pela segunda vez, na Universidade Federal Fluminense.

Do dia 23 de abril até 23 de outubro de 2007, o saguão da reitoria da UFF se manteve ocupado. Além de ter sido a mais longa ocupação de reitoria promovida pelos estudantes neste ano no Brasil, ela própria foi fruto de uma ocupação que em abril deste ano completará dois anos.

Próximo ao aniversário de seis meses, inconformados com o descaso por parte da reitoria, que apesar da promessa, não havia nem iniciado o processo de licitação do projeto de moradia, ainda que, conforme foi apresentado pelo vice-reitor, uma verba de quase cinco milhões havia sido destinada à UFF para ser utilizada em Assistência Estudantil. Os ocupantes, 27 naquele momento, fecharam, na noite do dia 22 de outubro, o espaço burocrático da reitoria, impedindo o funcionamento da mesma. No dia 23 a reitoria amanheceu fechada, e o reitor Roberto Salles, cancelou o Conselho Universitário deste dia, que ocorreria no espaço do cinema o qual estava aberto para funcionamento, utilizando a ocupação como justificativa. Além disso, ele envia a Polícia Federal para fazer o despejo, ignorando que quando se dá esta ação a ocupação já havia se massificado, obtendo a adesão dos manifestantes que se encaminharam para o Conselho Universitário a fim de protestar contra a aprovação do REUNI. A ordem era despejar os ocupantes tanto da reitoria como do Gragoatá, no entanto, o reitor teve de negociar, exigindo apenas a retirada da reitoria.

Deste evento até o dia 1 de fevereiro de 2008 a Ocupação do Gragoatá se manteve, apesar da precariedade da estrutura, a qual deixava os moradores numa situação de extrema vulnerabilidade climática (inclusive um morador sofreu séria crise de hipotermia, outros dois já tiveram pneumonia, dentre muitos outros problemas). As investidas da reitoria não cessaram, tendo sido constantes as ameaças por parte dos seguranças, uniformizados ou a paisana; proibição para o uso de alguns banheiros, além da limitação do horário e dias de semana; etc. E, na sexta-feira de carnaval, dia 1 de fevereiro, a reitoria efetivou o despejo da ocupação, conforme podemos observar na nota do acampamento.

O Acampamento Maria Júlia Braga - O Quilombo do Século XXI -, atualmente, se encontra instalado no Diretório Central dos Estudantes da UFF (DCE), onde se mantém firme em sua proposta e disposto a dar prosseguimento à sua luta política.

Acampamento Maria Júlia Braga - O Quilombo do Século XXI.